Ilustríssimos leitores do BLOG DO RAUL,
Abaixo, um texto de nosso Professor Marlon Nunes em que discute cinema e realidade.
Uma reflexão que pode suscitar à nossa inquietude em relação ao que se passa no Brasil de hoje, de 2017 e de tempos atrás em que éramos jovens adolescentes começando a nos inserir no mundo do conhecimento crítico.
Marlon nos revela em suas pesquisas o poder que as mídias têm de interferência ideológica sobre o sujeito, o que nos permite fazer um paralelo com o que nos ocorre, na realidade desse tempo que nos permeia, que já passamos por ele e que vem se tornando um engodo impregnado aos nossos anseios como um cabo de guerra nos puxando pra trás.
Sejamos mais fortes e curtamos essa análise de pensamento com cócegas na mente.
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Marlon Nunes, professor de Geografia, Sociologia e Filosofia. Poeta, Músico e Arte Educador. Mestrado em Estudos de Linguagens - CEFET MG |
UM
EXEMPLO DE HIPER-REALIDADE APLICADO À SOCIEDADE:
O filme Tropa de Elite e a ocupação das favelas no Rio de
Janeiro
Por
Marlon Nunes
Professor
de Geografia, Sociologia e Filosofia. Poeta, Músico e Arte Educador. Mestrado
em Estudos de Linguagens/CEFET-MG
Texto
apresentado e publicado no II CIDS - Congresso Internacional de Dialetologia e
Sociolinguística - Belém do Pará em setembro de 2012.
RESUMO:
Discutiremos a
relação entre a sequência cinematográfica Tropa de Elite e a consequente
ocupação dos aglomerados no Rio de Janeiro. Nossa contextualização terá como
direcionamento a análise fenomenológica de Baudrillard sobre o filme Apocalipse
Now, de Francis Ford Coppola, que trata da Guerra do Vietnã e demonstra como o
cinema pode servir de plataforma ideológica em nome do suposto progresso. O
Estado instala a guerra, que já não é mais somente física, mas midiatizada,
hiper-realizada. O objetivo do artigo não é fazer uma exclusiva análise dos
filmes, mas discutir os conceitos de hiper-realidade e simulação.
PALAVRAS-CHAVE:
Hiper-realidade. Cinema. Tropa de Elite.
ABSTRACT: In this paper, we
are going to discuss the relationship between the motion picture Tropa de Elite
and the consequent occupation of the “favelas” of Rio de Janeiro. Our
background statement will be led by the Baudrillard’s phenomenological analisys
on the movie Apoclipse Now, directed by Francis Ford Coppola. The movie is
about Vietnam War and shows how the cinema can be used as ideological platform
in the name of the so-called progress. The Nation begins the war, wich is not
only physical but also mediatic and hyperrealized. The purpose of this article
is not only to do an analysis of the movies themselves, but to discuss the
concepts of hyperreality and simulation.
KEY WORDS: Hyperreality.
Cinema. Tropa de Elite.
1 INTRODUÇÃO
A primeira invasão ao
Complexo do Alemão foi realizada em 28 de novembro de 2010 e a primeira
sequência do filme “Tropa de Elite” lançada em 5 de outubro de 2007. O cerco
aos traficantes estava preparado e constituído de vários homens e armamentos:
Desde sábado as forças
policiais e Exército mantinham cerco ao Complexo do Alemão. Forças policiais e
o Exército iniciaram na manhã deste domingo, por volta das 8h, a invasão ao
Complexo do Alemão, onde estão centenas de traficantes. No total, são 800
soldados da Brigada de Infantaria Paraquedista do Exército, 300 agentes da
Polícia Federal (PF) e 1,3 mil homens das polícias Militar e Civil mobilizados
na para operação no Rio de Janeiro. Blindados do Exército e da Marinha e
veículos do Batalhão de Operações Especiais da PM (BOPE) são utilizados na
operação. A Polícia Militar estima que entre 500 e 600 traficantes estejam no
Complexo do Alemão. Desde o sábado mais de 2 mil homens das forças de segurança
já estavam prontos para invadir o complexo de favelas e mantinham um cerco
posicionados nos 44 acessos do complexo. Na manhã deste domingo, uma hora antes
do início da invasão, ocorreram tiroteios intensos na região e os homens
estavam posicionados aguardando apenas a chegada dos helicópteros para iniciar
as operações. (JORNAL ESTADÃO, 2012)
Ao mesmo tempo, o armamento
midiático estava também preparado para mais uma batalha hiper-espetacular do
que já estava pré-ordenado. A Disneylândia e Hollywood sobem os morros
cariocas. As balas agora não são de festim, ferem não só quem está no fogo
cruzado, mas também os cérebros parados em frente aos tele-jornais dramalhões.
Helicópteros, carros, “motolinks”, câmeras de última geração. Tudo à disposição
do desencobrimento-encobrimento. Tudo a favor da simulação:
Quando o real já não é o que
era, a nostalgia assume todo o seu sentido. Sobrevalorização dos mitos de
origem e dos signos de realidade. Sobrevalorização de verdade, de objectividade
e de autenticidade de segundo plano. Escalada do verdadeiro, do vivido,
ressurreição do figurativo onde o objecto e a substância desapareceram.
Produção desenfreada de real e de referencial, paralela e superior ao
desenfreamento da produção material: assim surge a simulação na fase que nos
interessa – uma estratégia de real, de neo-real, e de hiperreal, que faz por
todo o lado a dobragem de uma estratégia de dissuasão. (BAUDRILLARD, 1991, p.
14)
A segunda sequência do filme
foi lançada em 8 de outubro de 2010. O tema agora, além da luta contra o
tráfico de drogas era também a disputa entre milícias formadas por policiais. E
em 13 de novembro de 2010, mais um aglomerado foi invadido pelo aparato
policial, a Rocinha. O que esses acontecimentos têm de provável ligação com a
compilação cinematográfica “Tropa de Elite”? O limite entre o real e a
imaginação, a Hiper-realidade .
Segundo Baudrillard (1991),
a Hiper-realidade é uma realidade construída e divulgada pelos meios de
comunicação sem nenhuma piedade dos que inocentemente acreditam nas belas
imagens produzidas e reproduzidas e ainda nas intermináveis hiper-propagandas.
O objeto do artigo então é essa relação hiper-real. O sentido já não faz
sentido ou apenas o sentido produtivista. O real e o irreal misturam-se. O
sentido foi implodido. É aí que a memória apaga-se juntamente com o real e
sobra apenas o irreal, o hiper-real. Sobram os pixels, os light-emitting diode,
sobra a magia dos códigos binários.
O real é produzido a partir
de células miniaturizadas, de matrizes e de memórias, de modelos de comando – e
pode ser reproduzido um número indefinido de vezes a partir daí. Já não tem de
ser racional, pois já não se compara com nenhuma instância, ideal ou negativa.
É apenas operacional. Na verdade, já não é o real, pois já não está envolto em
nenhum imaginário. É um hiperreal, produto de síntese irradiando modelos
combinatórios num hiperespaço sem atmosfera. (BAUDRILLARD, 1991, p. 8)
Somos diferentes, temos
nossas subjetividades, mas em cada uma delas antes agem os códigos binários das
telas e cada um ao seu modo rende-se ao fascínio criado pela “Tela Total”
(BAUDRILLARD, 2005).
Anulação da paisagem,
desertificação do território, abolição das distinções reais. O que até agora se
limita ao físico e ao geográfico, no caso de nossas auto-estradas, tomará toda
a sua dimensão no campo eletrônico com a abolição das distâncias mentais e a
compressão absoluta do tempo. Os curtos-circuitos (e a instauração desse
cyberespaço planetário equivale a um imenso curto-circuito) geram
eletro-choques. O que entrevemos não é mais somente o deserto do trabalho, o
deserto do corpo que a informação engendrará em razão de sua própria
concentração. (BAUDRILLARD, 2012)
Nosso ponto de vista sobre a
hiper-realidade é que a criação de imagens retira do objeto todas as suas
dimensões: o peso, o relevo, o cheiro, a profundidade, o tempo e,
principalmente, o sentido. O fetiche da imagem digital reside na desincorporação,
tornando a imagem pura objetividade. O auge da simulação consiste então em
restabelecer todas as dimensões suprimidas com o intuito de tornar a imagem
mais real que a realidade: “ela não tem relação com qualquer realidade: ela é o
seu próprio simulacro puro” (Baudrillard, 1991, p. 13). Sobre a perda da aura
das obras de arte na era da sua reprodutibilidade técnica, Benjamim observa
que:
Na época de Homero, a
Humanidade oferecia-se em espetáculo aos deuses olímpicos. Agora, ela se
transforma em espetáculo para si mesma. Sua auto-alienação atingiu o ponto que
lhe permite viver sua própria destruição como uni prazer estético de primeira
ordem. Eis a estetização da política, como a prática do fascismo. (BENJAMIM,
2012)
Benjamim (2012) salienta
ainda que todos os esforços para estetizar a política convergem para um ponto:
a guerra. Pois ela permite dar um objetivo aos grandes movimentos de massa,
preservando as relações de produção existentes. O professor Verlaine Freitas
(2012), citando Baudrillard (1995) escreve que: “Estamos aqui, no coração da
Amazônia...”: onde fica esse lugar? Como também o da guerra, da tempestade, da
pobreza... Na verdade ele não existe, pois tão somente figura o lócus da
substância vicejante do real, consumido através de uma rede imaginária
cuidadosamente articulada em torno da percepção de algo mais real do que a
própria realidade.
2 A GUERRA FAZ-SE FILME E O
FILME FAZ-SE GUERRA
Seguindo o exemplo das
análises de Baudrillard (1991) no seu texto sobre a película “Apocalypse Now”,
de Francis Ford Coppola, faremos a nossa sobre os filmes “Tropa de Elite”.
[...] a Guerra do Vietname,
em si mesma, talvez de facto nunca tenha existido, é um sonho, um sonho barroco
de napalm e de trópico, um sonho psicotrópico onde não estava em causa uma
vitória ou uma política, mas a ostentação sacrificial, destemida, de uma
potência filmando-se já a si própria no seu desenvolvimento, não esperando
talvez nada mais que a consagração de um superfilme, que remata o efeito de
espetáculo de massas desta guerra. (BAUDRIILARD, 1991, p. 78)
A questão da existência da
Guerra do Vietnã colocada por Baudrillard, nada mais é que uma grande ironia.
Ela existiu, tanto quanto os combates entre o Estado e o Poder Paralelo ou o
Estado e o Estado ocorrem nos morros cariocas. O que ele quis dizer é que os
filmes servem como etapas dessas guerras, simulam as invasões e demonstram
através das câmeras o desenvolvimento dos países, demonstram a produção de mais
do mesmo, ou seja, do produtivismo expansionista contemporâneo. Os filmes
estruturam sentimentos, ideias, memórias, comportamentos. Criam condições
necessárias para que existam as outras etapas. São por si só a exposição da
violência produtivista.
A guerra travada no conteúdo
de “Tropa de Elite” não é diferente. Vivemos o fascismo da imagem, a simulação.
O filme serve como desconstrução e construção, simulacro dos acontecimentos.
Simulação das futuras ações. Em Platão (2004, p.228) a imagem do mundo externo
à caverna era possível. Nossas cavernas tornaram-se telas desde o surgimento
dos cinescópios. Não há diferença entre o sensível e o inteligível. Não há
distinção entre real e falso. Vivemos o hiper-espetacular. O professor Juremir
Machado da Silva (2012) em seu texto “Depois do espetáculo”, analisando as
teses de Guy Debord (2012), escreve que:
O espetáculo era um
dispositivo de controle por meio da sedução. No hiper-espetáculo, quando tudo
se torna tela, cristal líquido e captação de imagem, todo controle é remoto.
Passamos da manipulação, estágio primitivo da dominação das mentes, e da
“servidão voluntária”, degrau superior da manipulação, à imersão total.
Evoluímos da participação, que pressupunha um sujeito e uma idéia de política,
para a interatividade, que reclama um jogador desinteressado. (MACHADO, 2012)
Somos então sugados pelas
telas, estamos integrados aos sistemas desenvolvimentistas, ao produtivismo
exacerbado. Tudo em nome do crescimento, pois o Brasil é a sexta maior economia
do mundo (JORNAL NACIONAL, 2011) e assim como afirmado por Baudrillard (1991)
em relação aos Estados Unidos durante as décadas de 60 e 70, uma potência
filmando-se a si própria no seu desenvolvimento (BAUDRILLARD, 1991).
Os mitos do bem-estar e das
necessidades possuem uma poderosa função ideológica de reabsorção e supressão
das determinações objectivas, sociais e históricas, da desigualdade. Todo o
jogo político do Welfare State e da sociedade de consumo consiste em
ultrapassar as próprias contradições, intensificando o volume dos bens [...].
[...] tudo isso nada significa, uma vez que pôr o problema em níveis de
igualização consumo já é substituir a busca dos objectos e dos signos [...]
pelos verdadeiros problemas [...]. (BAUDRILLARD, 1995, p. 48 e 49)
Tudo em nome da simulação.
No momento do lançamento do “Tropa de Elite” não interessava somente o lucro
das grandes produtoras de cinema, mas a difusão do conteúdo, da linguagem. E
assim foi feito. Sua linguagem tornou-se corriqueira. Os jovens seguiram
sarcasticamente as várias expressões e frases ditas pelos personagens do filme,
principalmente o suposto herói, Capitão Nascimento. A identificação com a
ficção é clara em muitos aspectos. Era fácil escutar alguém com as expressões
na ponta da língua: “fanfarrão, xerife, senhor, ‘pica’ (órgão sexual
masculino), aspira (aspirante)” e tantas outras utilizadas nos “Tropa de
Elite”. Em “A Sociedade de Consumo”, Baudrillard afirma que o consumo é “um
campo social estruturado em que os bens e as próprias necessidades, como também
os diversos indícios de cultura, transitam de um grupo modelo e de uma elite
directora para as outras categorias sociais” (BAUDRILLARD, 1995, p. 61).
Nossos Capitães Nascimento
estão preparados para enfiar a “porrada” no crime organizado e nos usuários de
entorpecentes como se fossem desaparecer de uma hora para outra de nossas
cidades. Vários traficantes foram expulsos e executados, mas os grandes chefes
continuam à solta (muito provavelmente aliados com os próprios poderes
estatais).
O filme “Tropa de Elite”
parece ter sido muito bem forjado para que as medidas de ocupação fossem
estabelecidas. Ou seja, conquista-se a confiança das massas, estudam o campo de
atuação pela ficção, agem psicologicamente e depois colocam em prática as suas
medidas paliativas. Além de serem fenômenos de bilheteria e de vendas, outro
aspecto que nos chama a atenção é que as sequências foram pirateadas muito
antes de serem lançadas:
O secretário-executivo do
Ministério da Justiça, Luiz Paulo Barreto, que preside o Conselho Nacional de
Combate à Pirataria e Delitos contra a Propriedade Intelectual, afirma que a
pirataria de que foi alvo o filme brasileiro "Tropa de Elite" contém
"um ineditismo" e "preocupa" o governo. O aspecto inédito
que o secretário aponta é a antecedência da venda de cópias ilegais em relação
à estréia do filme. (FOLHA.COM, 2011).
Ainda segundo o
secretário-executivo do Ministério da Justiça: "Não temos registro de algo
assim no Brasil e digo que é raro no mundo. Vemos casos em que a pirataria
entra simultaneamente à estréia nos cinemas ou dois ou três dias antes
dela" (FOLHA.COM, 2011). Quem nos garante que a fraude não possa ter sido
criada em prol do interesse comercial-estatal? Teríamos assim, com a pirataria,
um maior acesso ao conteúdo? Tornamo-nos mais interativos às invasões? Nos
dizeres de Orwell (2011) na obra “1984”:
A obediência não basta. A
menos que sofra, como podes ter certeza que ele obedece a tua vontade e não a
dele? O poder reside em infligir dor e humilhação. O poder está em se
despedaçar os cérebros humanos e tornar a juntá-los da forma que se estender.
Começas a distinguir que tipo de mundo estamos criando? É exatamente o
contrário das estúpidas utopias hedonísticas que os antigos reformadores
imaginavam. Um mundo de medo, traição e tormento, um mundo de pisar e ser
pisado, um mundo que se tornará cada vez mais impiedoso, à medida que se
refina. O progresso em nosso mundo será o progresso no sentido de maior dor.
(ORWELL, 2011)
A violência já descrita por
George Orwell em 1948, data de quando escreveu a obra 1984, está hoje
institucionalizada pelas mídias e Baudrillard (1991, p. 95) em seu texto “O
efeito Beaubourg” descreve que é uma violência ininteligível porque todo o
nosso imaginário está centrado na lógica dos sistemas em expansão.
3 CONCLUSÃO
No duo formado pelo Estado e
o Poder Paralelo, a população se perde e não sabe mais em quem confiar ou a
quem recorrer. A banda podre da polícia (as milícias) e os traficantes servem
de produto ideológico para a formação de uma sociedade cada vez mais violenta,
individualizada e sem sentido: niilista, hiper-real, onde as instituições
demonstram-se corrompidas. Durante
entrevista cedida ao programa “Roda Viva” da “TV Cultura”, o sociólogo Luiz
Eduardo Soares, ex-secretário de Segurança Pública nacional e do Rio de Janeiro
e um dos três autores dos livros “Elite da Tropa 1 e 2” que deram origem aos
filmes, salientou que:
[...] Qual o problema,
entretanto? É o triunfalismo. É a forma pela qual se começa a divulgar a ideia
de que: 1) vencemos o crime. Vencemos quem cara-pálida? [...] Enfatizando
triunfalmente que nós voltamos ao complexo do Alemão, nós estamos deixando de
lado a questão chave para o Rio de Janeiro que é fonte inclusive para a
prosperidade do tráfico, que é fonte inclusive para perda da soberania nacional
em certas áreas. Qual é essa fonte? O crime organizado centrado, radicado nas
instituições policiais que são tão importantes para o estado democrático de
direito, isso é gravíssimo. [...] Vivemos uma situação patética. (RADAR CULTURA, 2010)
O ex-secretário ainda
explica que:
Como cresceram as bocas de
fumo, como cresceu o tráfico no Rio de Janeiro? Quando nós contamos no exterior
o que é uma boca de fumo, as pessoas ficam perplexas e perguntam: ‘- mas como,
há uma loja, um local fixo, sedentário de venda varejista de drogas ilícitas? -
Sim, exatamente. - Então se os clientes sabem, a polícia sabe? – Sim,
exatamente. - Mas como isso pode manter-se e se reproduzir ao longo de décadas?
– Porque esses segmentos policiais são sócios do empreendimento criminal’. Como
que as armas chegam? Fala-se das fronteiras. Muito mais importante, muito mais
factível, é controlar a corrupção dentro da polícia, porque a polícia,
segmentos policiais fazem o tráfico. [...] A negociação impera no Rio de
Janeiro. Quando a política se vincula ao crime, quando passa ser interessante
para as forças políticas. Por exemplo: as milícias controlam os currais
eleitorais. [...] Até as eleições passadas nós víamos na TV candidatos a cargos
executivos abraçados com milicianos.
(RADAR CULTURA, 2010)
Jean Baudrillard (1991) em
seu livro “Simulacros e Simulação”, afirma que vivemos na época da
hiper-realidade e descreve a Disneylândia como o modelo perfeito de todos os
simulacros: “É antes de mais um jogo de ilusões e de fantasmas” (BAUDRILLARD,
1991, p. 20). Já a obra cinematográfica “A Cidade dos Sonhos”, de David Lynch
(citada por Baudrillard como um exemplo para o que ele escreveu em “Simulacros
e Simulação”) demonstra a enorme artificialidade do California Dreams;
consequentemente, e mais ainda, da indústria Hollywoodiana. A exemplo da
Disneylândia e da “Cidade dos Sonhos”, o “Tropa de Elite” demonstra que não há
mais uma diferenciação entre realidade e ficção, não é nem verdadeiro nem
falso, é uma máquina de dissuasão. A representação (Vorstellung), mímeses,
serve agora como simulação. Luis Costa Lima em análise do texto de Heidegger “O
que significa pensar” afirma que: “o domínio da representação ou de sua forma
mais corrente impõe a cegueira quanto ao que significa pensar” (LIMA, 2000, p.
84).
A publicidade (1991, p.
118), depois de ter veiculado durante muito tempo um ultimato implícito de tipo
econômico: compro, consumo, gozo, repete hoje sob todas as formas: voto,
participo, estou presente, isto diz-me respeito – espelho de uma zombaria
paradoxal, da indiferença de todo o significado público. Por mais que os
autores dos livros “Elite da Tropa” desejassem supostamente demonstrar a
realidade do Rio de Janeiro, mais uma vez, o conteúdo foi transformado em
hiperespetáculo cinematográfico. Apenas mais um dos instrumentos da “democracia
radical” (BAUDRILLARD, 2012).
Estamos dominados pelos
interesses fascistas do Mass media, pelo poder megalomaníaco do Estado e das
transnacionais, informacionais ou não. Além disso, quem nos dera a oportunidade
de colocarmos todos esses problemas na “conta do Papa” (como diria nosso mais
novo Herói Nascimento) ou dos “Pastores”, ou dos “Rabinos”, mas: “[...] é
perigoso desmascarar as imagens, já que elas dissimulam que não há nada por
detrás delas” (BAUDRILLARD, 1991, p. 12). A ocupação começou pela exibição
desregrada dos planos, das imagens. Iniciou-se pelos simulacros e pela
simulação. Transformou-se em hiperespetáculo.
REFERÊNCIAS
BAUDRILLARD, Jean. A
Sociedade de Consumo. Rio de Janeiro: Elfos Ed.; Lisboa: Edições 70, 1995.
______. Big Brother:
Telemorfose e criação de poeira. Disponível em: . Acesso em: 13 de janeiro de
2012.
______. Simulacros e
simulação. Lisboa: Relógio D'Água, 1991.
______. Tela Total: mitos-
ironias da era do virtual e da imagem. 4. ed. Porto Alegre: Sulina, 2005.
Disponível em: . Acesso em 04 de janeiro de 2012.
BENJAMIN, Walter. A obra de
arte na era da sua reprodutibilidade técnica. Disponível em: . Acesso em: 05 de
janeiro de 2012.
BRAGA, Eduardo Cardoso. Ser
ou Não-Ser: A Simulação e as Vicissitudes da Imagem Digital. Disponível em: .
Acesso em 03 de janiero de 2012.
DEBOR, Guy. Sociedade do
Espetáculo. Disponível em: . Acesso em: 05 de janeiro de 2012.
FOLHA.COM. Pirataria do
filme "Tropa de Elite" preocupa governo. Disponível em: . Acesso em:
09 de janeiro de 2011.
FREITAS, Verlaine. A
opacidade do real. Disponível em: . Acesso em: 20 de janeiro de 2012.
JORNAL ESTADÃO. Polícia e
Exército iniciam invasão no Complexo do Alemão. Acesso em: 4 de janeiro de
2012. Disponível em:
JORNAL NACIONAL. Brasil já é
a sexta maior economia do mundo, segundo consultoria britânica. Disponível em:
. Acesso em: 09 de janeiro de 2011.
JORNAL DO SENADO. Aumento do
consumo de drogas. Disponível em: . Acesso em: 09 de janeiro de 2012.
LIMA, Luiz Costa. Mímeses:
desafio ao pensamento. Rio de Janeiro; Civilização Brasileira, 2000.
ORWELL, George. 1984.
Disponível em: . Acesso em: 08 de janeiro de 2011.
PLATÃO. A República. Trad.
Enrico Corvisieri. São Paulo: Nova Cultural, 2004.
RADAR CULTURA. Roda Viva –
Luiz Eduardo Soares: Bloco 1. YouTube, 30 de novembro de 2010. Disponível em: .
Acesso em: 11 de janeiro de 2012.
SILVA, Juremir Machado.
Depois do espetáculo (reflexões sobre a tese 4 de Guy Debord) Disponível em: .
Acesso em: 17 de janeiro de 2012.
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